A família da minha mãe veio da Bahia. Uma parte, para mim, desconhecida, continua lá; mas meus avós migraram heroicamente para o Rio de Janeiro com cinco filhos prontos e um em andamento (no caso, a minha mãe, de quem minha avó estava grávida). Moraram, primeiramente, no Morro da Mangueira, depois, na Baixada Fluminense, até mamãe e papai ousarem nova trajetória geográfica: Guadalupe, Jacarepaguá, Copacabana.
Como filha caçula de uma família soteropolitana, mamãe cresceu entre os aromas de dendê, camarão seco, leite de coco, tapioca, mungunzá, galinha ao molho pardo. A cozinha da minha mãe tem cheiro de refogado de alho, cebola, azeite, coentro, pimenta do reino, bacalhau e camarão. E, apesar de ser filha e neta de verdadeiras especialistas em frutos do mar e comida baiana, o máximo que já fiz foi um filezinho de peixe assado – e no papillote. Não sei se confiando em minhas habilidades culinárias ou por falta de tempo para cozinha-lo ela própria, o fato é que mamãe deixou um pedaço de bacalhau no meu congelador. E perguntou, impaciente: “você ainda não fez isso, não?”. Hoje fiz.
Bacalhau é muito bacana de fazer. Ele já é delicioso, tem que se esforçar muito pra dar errado. E ele tem uma coisa que eu acho fantástica: exige que você manipule, como diz o vocábulo, com as mãos, nada de garfo, faca, essa palhaçada toda. Você tem que chafurdar a mão e desfiar, tirar as espinhas uma a uma, sentindo aquela consistência molenga e molhada. Adorável. Sabendo que jamais conseguiria superar as receitas de bacalhau de mamãe, pedi instruções apenas para um preparo básico e fiz minha própria receita. Quando comecei, pela primeira vez, a refogar o bacalhau, subiu aquele cheiro que eu já conhecia há tanto tempo, o cheiro da cozinha da minha mãe. Que emoção indescritível, nunca me senti tão parte da família. Eu, Cinthia Maria do Carmo.
Escondidinho de Bacalhau
500g de bacalhau
2 tomates
½ cebola roxa picada
3 dentes de alho
1 colher (chá) de pimenta preta em grão
250 gramas de catupiry
700g de batata
200g de creme de leite
2 colheres de manteiga
pimentão amarelo e vermelho
sal
óleo
azeite
pimenta do reino branca em pó
coentro
azeitonas portuguesas
parmesão ralado
Dessalgue o bacalhau (como? Também não sei, vou perguntar pra minha mãe e publico futuramente). Coloque-o numa panela com água fria e leve ao fogo. Quando levantar fervura, apague o fogo. Retire o bacalhau e reserve a água. Espere esfriar e desmanche as postas com as mãos, retirando as espinhas. Refogue a cebola e o alho com o óleo e o azeite. Quando estiver dourado acrescente o bacalhau. Mexa e, quando estiver seco ou começar a grudar na panela, acrescente um pouco da água da fervura. Quando ficar com uma cor amarelada (isso vai demorar um pouco, uns 15 minutos), acrescente o tomate picado, a pimenta em grão e mais água da fervura. Deixe cozinhar até amolecer os tomates. Acrescente os pimentões picados e as azeitonas, deixe secar um pouco a água. Desligue o fogo com o bacalhau “molhadinho” e salpique o coentro picado. Faça o purê de batatas: numa panela, derreta a manteiga e junte as batatas cozidas e espremidas e o creme de leite. Mexa até homogeneizar. Corrija o sal. Monte o prato: espalhe o bacalhau sobre o fundo de um refratário, cubra com uma camada de catupiry e outra de purê de batata. Salpique a pimenta branca em pó e o queijo ralado e gratine em forno preaquecido por 20 minutos. Sirva quente e cremoso.