segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Ceviche brasileño


Olha, esse negócio de cozinha típica de um lugar em outro é meio complicado. Restaurante de comida mineira, por exemplo, nunca tem o gosto da que a gente come em Minas. Aqui em São Paulo fazem tutu de feijão carioca e torresmo pururucado – em Minas, só comi tutu de feijão preto e o torresmo era um simples e delicioso bacon frito. Comida baiana fora da Bahia, então... é um tal de trocar o azeite de dendê por óleo de soja, de trocar a pimenta da receita por aquele vidrinho de pimenta vermelha em cima da mesa... Tive um pouco dessa sensação quando experimentei o ceviche do Killa.

Ceviche está para o Peru como a feijoada está para o Brasil – se não é o prato mais popular e representativo da identidade nacional, pelo menos, é que o todo mundo acha. Feito de cubos de peixe branco marinado em limão e temperos, leva cebola roxa, salsa (ou coentro, não lembro), pimenta e pode ser acompanhado de milho, batata (mas não os que a gente conhece: eles têm muitos outros e surpreendentes tipos de milho e batata), tortilla... Embora já faça mais de um ano que provei o prato em Lima, lembro bem da sensação de comer um peixe que não foi cozido (no fogo) e não tinha gosto de cru! Parecia mágica. A marinada, à base de limão, era cítrica sem ser azeda, o peixe tinha textura macia, desmanchava na boca. E o choclo – uma variedade de grãos brancos e enormes – saciava e confundia meu conceito monocórdico de milho.

Aí veio o Prêmio Paladar 2009 e disse que o ceviche do Killa era o melhor. Fui lá. O restaurante é pequeno, bonito e aconchegante, o atendimento é ótimo. O ceviche é bom, mas não é igual. Achei que alguns pedaços do peixe tinham gosto de cru. E sei lá, a marinada, embora estivesse muito saborosa, era menos complexa. E o pisco sour – a caipirinha do Peru, feita de pisco (aguardente de uva), limão e clara de ovo - era menos encorpado. O que quero dizer é: estava bom, mas não era igual. E fiquei na dúvida: será que é possível deslocar o sabor da sua geografia? Acho que além de ingredientes e técnicas, a culinária também é feita de clima, de vegetação, de solo, de altitude, de idioma, de folclore, de crenças. E das pessoas que vivem tudo isso.

Foto: Ceviche Tradicional do Killa (sem lula e com mais camarão). Crédito: Cinthia Gomes

Serviço: Killa – R. Tucuna, 689, Perdizes, São Paulo/SP. Fone: (11) 3872-1625

3 comentários:

  1. Ai, queria ir muito para o Peru. Mas por enquanto, voto em Fernando de Noronha, que é a mesma distância, só que pro lado contrário. E digo mais, é meia viagem para a Europa.

    O post está delicioso
    Beijos

    ResponderExcluir
  2. concordo plenamente com as considerações geográficas. o prato parece delicioso. outro dia pude experimentar a magia das mãos nativas em solo estrangeiro: preparei caipirinha com 51 que levei do brasil para a colômbia para uns gringos em bogotá. tive a sensação de ser o próprio baluarte da cultura carioca. sensacional. adorei o blog.bj.

    ResponderExcluir
  3. É, a culinária pertence ao lugar, não tenho dúvida. Mas pô, a exportação dela serve ao menos pra ter um gostinho, né? :-)

    ResponderExcluir